domingo, maio 12, 2013

Ilíada e Odisseia, a fundação do humano e a inauguração da literatura

Pouco se sabe a respeito de Homero, até mesmo a cidade onde teria nascido é palco de controvérsias. O período em que a Ilíada e a Odisseia foram escritas também é outro ponto para discussão. Alguns pesquisadores acham que os poemas são do século VIII a.C., enquanto outros apontam o século VII e até mesmo o VI. O consenso é de que esses dois poemas épicos são os fundadores da literatura ocidental, ainda mantendo intensa atualidade.

A Ilíada descreve e narra a Guerra de Troia, desde as suas motivações, a genealogia dos deuses, dos heróis, os detalhes das batalhas e o intrincado conluio entre os habitantes do Olimpo e os homens. A Odisseia já trata da vida de um homem, Odisseu, mais conhecido como Ulisses, seu nome latino.

Atualmente, nas livrarias, é possível encontrar os dois livros em edições muito bem cuidadas. A Ilíada, em capa dura e arte final perfeita, traduzida por Odorico Mendes, famoso intelectual brasileiro que viveu no século XIX, é da Ateliê Editorial. A tradução é tão bem resolvida que se tornou modelo entre aqueles que desejam seguir essa muitas vezes ingrata carreira de tradutor. A Odisseia já aparece em edição mais simples, porém bilíngue e também muito bem acabada, traduzida pelo conhecido professor Trajano Vieira, com posfácio de Ítalo Calvino; a editora é a 34. Na Odisseia há ainda inúmeras notas, a geografia do Mediterrâneo à época em que se passaram a guerra de Troia e as viagens de Ulisses (calcula-se que a guerra tenha ocorrido entre 1300 e 1200 a.C., logo seis ou sete séculos antes de se transformar em literatura), e o sumário dos cantos.

O motivo da Ilíada, como todos sabem, é a fuga de Helena (mulher de Menelau, rei de Esparta) e Páris para Troia (alguns afirmam que ela teria sido raptada), o que motivou uma espécie de aliança entre várias cidades-estados da Grécia para acorrer à Ásia menor e trazê-la de volta. Só que, entre marchas e contramarchas, a guerra dura dez anos. Os gregos combatem sob o comando de Agamêmnon.

Já a Odisseia narra a volta de Ulisses a Ítaca, ilha governada por ele. Mas o herói, autor do cavalo de madeira que enganou os troianos e tornou possível aos gregos a vitória, leva vinte anos para conseguir retornar a sua ilha, somando o tempo que durou a guerra. Ele sofre no percurso todo o tipo de atribulações.

Enquanto a Ilíada é pungente porque além de cantar a vitória das hostes aliadas ressalta a desventura dos que morrem em terra estrangeira, a Odisseia nos aponta o percurso de um homem e sua solidão. Apesar do caráter heroico atribuído a Odisseu, não há quem não se identifique com ele quando se trata dos problemas humanos. O herói é levado cada vez para mais longe de casa; experimenta a ameaça de monstros inimigos, feiticeiras, sereias, tempestades e naufrágios. Seus companheiros vão pouco a pouco perdendo a vida pelo caminho e, quando consegue voltar para casa, Ulisses chega sozinho e em nau estrangeira. Além disso, precisa disfarçar-se para tramar a vitória sobre os pretendentes que assediam sua esposa. Como havia duas décadas que partira e jamais dera notícias, muitos achavam que ele morrera enquanto navegava de volta a sua Ítaca. A viagem de Ulisses é tão tormentosa que ele chega a ir ao Hades – na mitologia grega é a terra dos mortos –, onde reencontra muitos dos seus companheiros que pereceram no campo de batalha, como Ajax e Aquiles. Também descobre entre os mortos sua mãe, que ainda vivia quando ele partiu para a guerra.

Em algumas paragens, o herói também é recompensado com a lealdade e a amizade, como entre os feácios. Estes o acolhem, enchem-no de presentes e o transportam de volta a Ítaca.

Outro episódio interessante ocorre logo que ele desembarca e vai à própria casa apresentando-se como um estrangeiro que pede abrigo, disfarce para driblar os pretendentes de sua mulher. É reconhecido por Argos, seu cachorro, que já tem vinte anos de idade. O animal se agita ante a aproximação do herói, dá demonstração de fidelidade e morre logo em seguida. Uma criada também o reconhece. Uma vez que era costume entre os gregos ofertar banho aos estrangeiros, a criada que o leva reconhece a cicatriz que ele possui num dos joelhos, fruto de um acidente que sofreu quando criança ao acompanhar o avô na caça ao javali.

Apesar de ambas as histórias terem como pano de fundo a guerra, principalmente a Ilíada, vemos diversas demonstração de amor, lealdade e amizade. Ressalte-se o sentimento do herói, Ulisses, que nos ensina como é difícil viver como estrangeiro, pior ainda na própria terra.

Embora os leitores de primeira viagem possam encontrar alguma dificuldade no começo, a leitura de ambos os livros pouco a pouco se torna mais fluida e agradável. Ler esses dois clássicos da literatura acaba tornando-se não apenas uma questão de cultura, mas de humanidade.