O que eu gostaria de ressaltar não é o avanço do direito ao esclarecimento sobre o paradeiro dos desaparecidos políticos. Está aí a Comissão da
Verdade, em cujos componentes depositamos nossa confiança para que nos
revelem os crimes e os excessos cometidos, sobretudo por quem detinha na época o
poder. O que destaco é a atuação desse jornalista que, apesar da idade
avançada, persiste vigoroso em seu trabalho. Dines viajou a Vitória para
entrevistar o tal personagem, como viajaria a qualquer outro lugar se houvesse
a perspectiva de fazer um programa esclarecedor e sempre a serviço do cidadão.
Nos dias de hoje, quando impera a busca desenfreada pela
audiência a qualquer preço, o programa “Observatório da Imprensa” tem atuado no
sentido de colocar em questão a própria imprensa, isto é, os meios de
comunicação, incluindo aí as poderosas emissoras de TV. É sempre bom destacar o
papel da TV Brasil, pois se trata de uma emissora pública que procura trazer à
sua audiência programas de natureza cultural, plenos de apuro e sofisticação.
Vivemos num século dominado pelo consumo exacerbado, por
isso muitos jornais, revistas, rádios e TVs existem quase que somente para
corroborar essa ideologia. O Observatório, no entanto, fazendo crítica à
imprensa, mostrando que publicações, rádios e TVs não devem se colocar como empresas comerciais quaisquer, traz ao espectador a consciência de que informação
digna não é mercadoria que se fabrica de qualquer maneira e se vende a qualquer
preço.
O ponto forte do último programa não foi apenas ouvir da própria voz as atrocidades cometidas pelo ex-delegado do Dops, mas também mostrar que, durante os anos em que estiveram
no poder, não apenas os militares se beneficiaram, mas muitos civis sob a proteção
deles abocanharam sua parcela de lucro sem precisar dar satisfação ao povo. Daí
a dificuldade de se esclarecer os crimes da ditadura. Para muita gente, seria
melhor que tudo ficasse esquecido. Como revelar a verdade do período se quem
mais colaborou com os militares encontra-se hoje na crista da onda da audiência?
O entrevistado deu nome a vários profissionais de imprensa e também a jornais,
rádios e emissoras de TV. Árdua tarefa a de Dines, mas ele é um obstinado e
apaixonado repórter. Seu programa continua a mostrar a qualidade que é possível existir mesmo numa pequena parcela da imprensa brasileira, incluindo aí a
própria TV.
Assunto muito discutido atualmente, mas de pouco
empreendimento, é a leitura. A própria TV gosta muito de anunciar que o
brasileiro lê pouco. Mas, uma vez que as mesmas emissoras apelam para nos
manter horas a fio hipnotizados ante suas programações, como a leitura seria possível, principalmente considerando a enorme audiência entre a população de baixa renda? Percebem-se ardilosas estratégias que objetivam manter o
espectador com a TV ligada durante o máximo de tempo. Há espetáculos esportivos
durante todo o dia, uma enxurrada de notícias desnecessárias, reality shows, passando
inclusive por telenovelas e programas religiosos. Às vezes o espectador
sente-se, ainda que inconscientemente, participante de uma irmandade da qual
não se pode desligar porque, caso o faça, mergulhará num estado de mais
profunda solidão. Com essa questão parece que me desviei do assunto inicial, mas tem tudo a ver.
Por mais importante que sejam todos os meios de comunicação,
quando se deseja transmitir algo deveras importante, recorre-se ao livro. E foi
isso que aconteceu. O torturador arrependido, em crise de consciência por causa
de sua religiosidade tardia, recorreu a dois jornalistas que acharam melhor
publicar sua confissão em livro.
Não esperem da grande imprensa, inclusive da TV comercial, grande
destaque à questão. Não pela falta de importância histórica do assunto nem pelo fato de um país de leitores ameaçar a audiência das TVs. Mas porque
existe algo de podre, difícil de levar para longe da porta da própria casa.
Um comentário:
Parabéns pela abordagem lúcida bem fundamentada do assunto em tela
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