A Ilíada descreve
e narra a Guerra de Troia, desde as suas motivações, a genealogia dos deuses,
dos heróis, os detalhes das batalhas e o intrincado conluio entre os habitantes
do Olimpo e os homens. A Odisseia já
trata da vida de um homem, Odisseu, mais conhecido como Ulisses, seu nome
latino.
Atualmente, nas livrarias, é possível encontrar os dois
livros em edições muito bem cuidadas. A Ilíada,
em capa dura e arte final perfeita, traduzida por Odorico Mendes, famoso
intelectual brasileiro que viveu no século XIX, é da Ateliê Editorial. A
tradução é tão bem resolvida que se tornou modelo entre aqueles que desejam
seguir essa muitas vezes ingrata carreira de tradutor. A Odisseia já aparece em edição mais simples, porém bilíngue e também
muito bem acabada, traduzida pelo conhecido professor Trajano Vieira, com
posfácio de Ítalo Calvino; a editora é a 34. Na Odisseia há ainda inúmeras
notas, a geografia do Mediterrâneo à época em que se passaram a guerra de Troia
e as viagens de Ulisses (calcula-se que a guerra tenha ocorrido entre 1300 e
1200 a.C., logo seis ou sete séculos antes de se transformar em literatura), e
o sumário dos cantos.
O motivo da Ilíada,
como todos sabem, é a fuga de Helena (mulher de Menelau, rei de Esparta) e Páris
para Troia (alguns afirmam que ela teria sido raptada), o que motivou uma
espécie de aliança entre várias cidades-estados da Grécia para acorrer à Ásia
menor e trazê-la de volta. Só que, entre marchas e contramarchas, a guerra dura
dez anos. Os gregos combatem sob o comando de Agamêmnon.
Já a Odisseia
narra a volta de Ulisses a Ítaca, ilha governada por ele. Mas o herói, autor do
cavalo de madeira que enganou os troianos e tornou possível aos gregos a
vitória, leva vinte anos para conseguir retornar a sua ilha, somando o tempo
que durou a guerra. Ele sofre no percurso todo o tipo de atribulações.
Enquanto a Ilíada
é pungente porque além de cantar a vitória das hostes aliadas ressalta a
desventura dos que morrem em terra estrangeira, a Odisseia nos aponta o percurso de um homem e sua solidão. Apesar do
caráter heroico atribuído a Odisseu, não há quem não se identifique com ele quando
se trata dos problemas humanos. O herói é levado cada vez para mais longe de
casa; experimenta a ameaça de monstros inimigos, feiticeiras, sereias,
tempestades e naufrágios. Seus companheiros vão pouco a pouco perdendo a vida
pelo caminho e, quando consegue voltar para casa, Ulisses chega sozinho e em
nau estrangeira. Além disso, precisa disfarçar-se para tramar a vitória sobre
os pretendentes que assediam sua esposa. Como havia duas décadas que partira e
jamais dera notícias, muitos achavam que ele morrera enquanto navegava de volta
a sua Ítaca. A viagem de Ulisses é tão tormentosa que ele chega a ir ao Hades –
na mitologia grega é a terra dos mortos –, onde reencontra muitos dos seus
companheiros que pereceram no campo de batalha, como Ajax e Aquiles. Também
descobre entre os mortos sua mãe, que ainda vivia quando ele partiu para a
guerra.
Em algumas paragens, o herói também é recompensado com a
lealdade e a amizade, como entre os feácios. Estes o acolhem, enchem-no de
presentes e o transportam de volta a Ítaca.
Outro episódio interessante ocorre logo que ele desembarca e
vai à própria casa apresentando-se como um estrangeiro que pede abrigo,
disfarce para driblar os pretendentes de sua mulher. É reconhecido por Argos,
seu cachorro, que já tem vinte anos de idade. O animal se agita ante a aproximação
do herói, dá demonstração de fidelidade e morre logo em seguida. Uma criada
também o reconhece. Uma vez que era costume entre os gregos ofertar banho aos
estrangeiros, a criada que o leva reconhece a cicatriz que ele possui num dos joelhos,
fruto de um acidente que sofreu quando criança ao acompanhar o avô na caça ao
javali.
Apesar de ambas as histórias terem como pano de fundo a
guerra, principalmente a Ilíada,
vemos diversas demonstração de amor, lealdade e amizade. Ressalte-se o sentimento
do herói, Ulisses, que nos ensina como é difícil viver como estrangeiro, pior
ainda na própria terra.
Embora os leitores de primeira viagem possam encontrar
alguma dificuldade no começo, a leitura de ambos os livros pouco a pouco se
torna mais fluida e agradável. Ler esses dois clássicos da literatura acaba
tornando-se não apenas uma questão de cultura, mas de humanidade.
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